Degradação
Patrimônio ainda é alvo de crimes ambientais
Diário Popular acompanha saída da 3ª Companhia Ambiental para monitorar Arroio Pelotas e confirma: local sofre - sem previsão de fim - os efeitos da ocupação humana
Paulo Rossi -
Quase um ano depois de o Ministério Público (MP) cobrar ações de fiscalização da prefeitura, o Diário
Popular volta ao Arroio Pelotas - patrimônio cultural do Estado - e o cenário é exatamente o mesmo: a Área de Preservação Permanente (APP) segue como alvo de crimes ambientais. Construções irregulares, desmatamento e atividades não licenciadas são situações recorrentes. E acabam por confirmar: não há data certa para o Procedimento Administrativo aberto pelo MP, no começo do ano passado, chegar ao fim.
Quem garante é o titular da 2ª Promotoria de Justiça Especializada, André Barbosa de Borba. E os próximos passos já estão definidos: os olhares deverão se voltar às residências, em uma análise caso a caso que irá indicar se as mansões possuem licenças e se devem reparar ou compensar os danos ambientais que tenham causado ao longo dos anos, principalmente quando o tema em pauta são a degradação das margens e a ameaça ao corredor ecológico (leia mais na página 3), engolido por muros, decks de madeira, quiosques, barreiras de pneus, atracadouros e rampas que, não raro, avançam para dentro do arroio.
Antes, um estudo, à luz do Código Florestal - de 2008 - deverá indicar o que é ou não permitido, para que o próprio Ministério Público, a Secretaria de Qualidade Ambiental (SQA) e a 3ª Companhia Ambiental estejam, realmente, em condições de desenvolver ações coordenadas, com um mesmo entendimento sobre a legislação - destaca o promotor.
“Neste um ano houve evolução, mas ainda há mais a ser feito”, enfatiza, ao se referir aos Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) firmados para regularização de clubes, de marinas e de empreendimentos licenciáveis. Com a análise, criteriosa, se poderia apontar se alguma das estruturas deverá ou não ser removida - explica Borba.
A posição da SQA
O secretário de Qualidade Ambiental, Felipe Perez, reconhece a importância das ações e assegura: não há prazo para o trabalho se encerrar. Nem o MP estabeleceu limite para o Executivo apertar o cerco nas fiscalizações. “É um trabalho de vigilância permanente”, resume. E admite que a SQA não dispõe de estrutura para uma equipe atuar, exclusivamente, no Arroio Pelotas. “O município não tem perna para fazer uma abrangência total, mas a gente tá permanentemente olhando, analisando, questionando e chamando quando acha que tem alguma irregularidade”, afirmou Perez. E, assim como o promotor, também mencionou o processo de regularização dos clubes.
A palavra da Companhia Ambiental
A preservação do Arroio Pelotas deve voltar a ser um dos alvos da 3ª Companhia Ambiental, que entre dezembro e janeiro concentrou forças no combate à pesca predatória. Ao longo de 2016, os seis casos de irregularidades que resultaram em autuações, no Arroio Pelotas, foram encaminhados à Justiça e ao Ministério Público - informa o comandante André Avelino.
E, ao conversar com o Diário Popular, o capitão fez questão de ressaltar a ampla área de abrangência na região. Só de Costa Doce são 618 quilômetros de extensão, afora os recursos hídricos em outros municípios e as reservas ecológicas. O foco das equipes, entretanto, é sempre o mesmo: atender tanto as diligências e as vistorias solicitadas pelo Judiciário e pela Promotoria quanto as denúncias da comunidade, com o mesmo objetivo: colher o máximo de informações possíveis, através de documentação, para enviar aos órgãos, seja na esfera cível, penal ou administrativa.
Daí por diante, os desdobramentos não dependem da Companhia Ambiental. “São eles, o Judiciário, o Ministério Público e a prefeitura, que têm o poder de decisão, de fazer cumprir a lei, reitera. E ao monitorar o Pelotas na tarde da sexta-feira, 24 de fevereiro - acompanhado do DP -, o capitão aponta à captação de água do arroio, identifica um novo muro de telhas e uma nova rampa construída no local. São alterações que nunca cessam.
A agressão à natureza
A destruição da vegetação nativa, em especial da mata ciliar, vai muito além de modificações na paisagem.
As intervenções nas margens atingem diretamente o corredor ecológico. E, sem essa conectividade, o fluxo das espécies é atingido em todos os aspectos: para movimentação, para reprodução e também para alimentação. A preocupação é, mais uma vez, expressa pelo professor da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), Marcelo Dutra da Silva, que já encaminhou denúncia ao MP e a órgãos ambientais.
E, em tom de preocupação, o ecólogo reitera: o fato de empreendimentos e residências já terem obtido licença, ao longo dos anos, para erguerem suas construções não significa que os danos não tenham ocorrido.
E vai além: “Conceder licença em um bem público natural para fins privados é discutível”. Para minimizar o estrago, portanto, uma das formas seria a revegetação. Trocar o espaço, hoje ocupado por pneus, decks de madeira, atracadouros e quiosques, pela recuperação da cobertura ciliar.
“Mas a prefeitura não está cumprindo seu papel de cuidar e de fiscalizar nem trabalha a educação ambiental”, lamenta.
Os principais prejuízos com a destruição das margens
1) O corredor ecológico é diretamente atingido e interfere no fluxo das espécies, seja para movimentação, alimentação ou reprodução.
2) Sem a mata ciliar, compromete-se o habitat. Com porções cada vez menores de área preservada, algumas espécies tendem a desaparecer do local, devido às condições inviáveis de permanecer.
3) Os riscos de erosão e de inundações também crescem sem a vegetação, que serve como barreira de proteção. De contenção.
4) Perde-se na qualidade da água, já que a cobertura ciliar funciona como filtro. Com a intervenção nas margens, perde-se um dos mais importantes serviços ambientais prestados pela vegetação.
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